Vai investir? O que é melhor: aporte grande uma única vez, ou aportes menores e recorrentes?

O SaldoZero vem desenvolvendo uma série de materiais que visam elucidar diferentes estratégias de investimentos.

O último, e talvez o mais importante foi “A verdade nua e crua: você poderia ter ganho mais dinheiro investindo em CDI ao invés do Ibovespa. Este artigo visa clarificar questões relacionadas ao cenário brasileiro e nossa enraizada cultura dos juros altos ao qual por vezes propiciou que o CDI viesse a bater o Ibovespa. Por meio de diferentes estratégias de carteira, mostro que existem opções inteligentes para quem busca retornos superiores..

Outro artigo bastante interessante, chamado “Qual a melhor estratégia de aportes para Bolsa de Valores: comprar ações na baixa ou fazer aportes mensais?, visa demonstrar a diferença entre aportes recorrentes comparado a estratégia de buscar comprar ativos de bolsa nos momentos de baixa.

Além disso, estes trabalhos de estudo sobre estratégias de composição de carteira teve início com o precursor Por que combinar Renda Fixa, Renda Variável e Dólar em uma única carteira pode ser uma estratégia inteligente? — artigo este que foi de grande relevância ao meu livro Montando uma Carteira de Investimentos Inteligente.

Estes artigos vêm a agregar no sentido que, mais do que buscar informação, precisamos estudar, compreender e trabalhar a informação. Não basta simplesmente acreditarmos em algo que nos foi dito.

E é neste sentido que trago mais um estudo. O que seria melhor: aportar uma única vez um montante relativamente grande, ou, aportar pequenas quantias recorrentemente?

Imagino que este tipo de estudo pode agregar àqueles que, se vêm com um capital relevante em mãos e ficam na dúvida se o mais sensato seria investir tudo de uma única vez ou, fatiar este capital em quantias menores para o investimento seja realizado aos poucos.

Portanto, se esse tema é de seu interesse, confia, vem comigo que o material está incrível.

O viés da confirmação

Peter Wason, em 1960, citou, pela primeira vez, seu estudo sobre o viés da confirmação. Esse viés em linhas gerais no diz que, estamos abertos a aceitar uma tese já pré-concebida por nós mesmos.

Em outras palavras, se você acredita fielmente que aportar uma única vez é melhor e eu digo o contrário, tenho grandes chances de não ser bem aceito, e você procurará alguma forma de rebater minhas ideias.

Do outro lado, se você tem uma opinião que aportes recorrentes são melhores e eu confirmo, você terá a tendência de se autoafirmar com um alto e claro: “eu sabia!”.

Digo isso pois sei que muita gente não vem buscar exatamente um conhecimento, mas sim uma informação que se reafirme.

Neste sentido, meu objetivo não será rebater, tampouco reafirmar qualquer tipo de viés. Mas, pretendo, por diversas informações postas à mesa, permitir que você possa ter condições de concluir, por si próprio, o que fará mais sentido para sua estratégia de investimentos.

O rápido e devagar

Daniel Kahneman em seu livro Rápido e Devagar, dentre seus diversos ensinamentos, nos traz uma questão a qual a estatística pode ser manipulável, e por consequência, manipuladora.

Minha aptidão por números, dados e planilhas pode facilmente induzir pessoas ao que eu pretendo concluir como tese. Fique tranquilo que não vou manipular nada neste artigo.

Mas a mensagem que trago é que, diversos materiais que você encontrará, na internet em especial, são extremamente manipulados. Um exemplo disso foi o que citei em “A verdade nua e crua: você poderia ter ganho mais dinheiro investindo em CDI ao invés do Ibovespa aonde diversos influencers trazem estudos americanizados como conclusão de comportamento para o mercado financeiro brasileiro — o que não se confirma como válido.

Eu poderia muito bem ludibriar os menos atentos, buscar o histórico das taxas de renda fixa (Selic e CDI) e concluir que, é melhor um único aporte grande, uma vez que o capital ficaria empregado por um maior número de períodos as taxas de mercado.

Se olhássemos somente para renda fixa, faria total sentido.

Contudo, poderia ser considerado um estudo equivocado, incompleto e maldoso até certo ponto, visto que quando estamos falando de mercado financeiro, salvo raras as exceções, a grande maioria investirá em ativos variáveis, ao qual podem ter rentabilidades negativas, anulando assim a conclusão anterior.

E é deste modo que você notará que os estudos que trarei neste artigo não possuem uma única resposta, tampouco foram simulados por um único caminho ou intervalo de tempo. Até porque, o que vem por baixo: o arroz ou feijão? A resposta é que depende.

O estudo

De maneira extremamente objetiva, o estudo entre aportar uma única vez ou realizar aportes recorrentes se deu por dois diferentes tipos de carteira e cinco períodos de tempo. Temos então 20 cenários diferentes.

Os dois tipos de carteira são velhos conhecidos do SaldoZero. O primeiro seria uma carteira investida 100% em bolsa, representado aqui pelo índice Ibovespa. O segundo é a carteira a qual abordo em detalhe em meu livro, assim como em outros artigos, vídeos e série da carteira pública: proteção caixa; proteção cambial e; agressão em renda variável.

Os quatro períodos de tempo são compreendidos por: 1995-2021; 2000-2021; 2010-2021; 2015-2021 e; 2020-2021. Importante comentar que, todos os cenários tiveram os aportes sensibilizados pela inflação — explicarei melhor esta questão no decorrer do texto.

Os resultados são bastante surpreendentes. Vejamos:

1995-2021

O primeiro cenário é a comparação entre um único aporte em 1995 no valor de R$10mil contra pequenos aportes mensais.

Complementando o fator inflação ao qual eu havia introduzido: o montante de R$10mil de 1995 obviamente não tem o mesmo poder de compra em 2021. Deste modo, é importante compreender dois pontos:

  • Os R$10mil de 1995, corrigidos, se equivalem a R$59mil em 2021;
  • Para os aportes recorrentes, foram considerados os mesmos R$59mil totais em aportes de R$183,93 mensais. Contudo, neste caso foi revertido o efeito da inflação para que, em 1995 o primeiro aporte corresponda ao valor de R$30,94 até o último aporte em 2021 no próprio valor de R$183,92.

Em outras palavras, tive o cuidado de comparar os dois cenários com equivalência do valor do dinheiro no tempo. Esta explicação valerá para os cenários subsequentes.

Os resultados:

CenárioAportes acumulados (corrigidos pelo IPCA)Capital final no período
Ibovespa (1 único aporte)R$ 59.774,12R$ 248.639,85
Ibovespa (aportes recorrentes)R$ 59.774,12R$ 94.777,86
Carteira (1 único aporte)R$ 59.774,12R$ 479.015,35
Carteira (aportes recorrentes)R$ 59.774,12R$ 148.557,68

Como podemos notar, se considerarmos o intervalo de 1995 a 2021, é claro que, um único aporte teria tido um resultado extremamente superior aos aportes recorrentes. Contudo, é possível concluirmos que essa será recorrentemente a melhor opção? De maneira alguma.

Quando comento que não podemos tomar nenhuma conclusão enviesada, é disso que estou falando. Acreditar e concluir algo, por um único ponto de vista, pode nos condicionar a tomar decisões que nem sempre serão as mais assertivas.

2000-2021

Avançando a comparação em 5 anos. Vejamos se a vantagem continua a favor dos aportes únicos.

Os resultados:

CenárioAportes acumulados (corrigidos pelo IPCA)Capital final no períodO
Ibovespa (1 único aporte)R$ 38.011,27R$ 63.165,98
Ibovespa (aportes recorrentes)R$ 38.011,27R$ 31.302,35
Carteira (1 único aporte)R$ 38.011,27R$ 131.391,45
Carteira (aportes recorrentes)R$ 38.011,27R$ 45.122,78

De 2000 até 2021 o resultado se repetiu. De toda maneira, como comentei e reforço, precisamos analisar diversos cenários antes de qualquer tipo de conclusão. Nosso objetivo é verificar se há algum padrão que nos ajude a responder melhor este tipo de questão.

2010-2021

Novamente, um avanço na história. O que teria acontecido com aqueles investidores que tivessem optado por tais distintas estratégias.

Os resultados:

CenárioAportes acumulados (corrigidos pelo IPCA)Capital final no período
Ibovespa (1 único aporte)R$ 19.984,46R$ 15.267,33
Ibovespa (aportes recorrentes)R$ 19.984,46R$ 16.101,25
Carteira (1 único aporte)R$ 19.984,46R$ 25.167,00
Carteira (aportes recorrentes)R$ 19.984,46R$ 18.889,38

Diferente aos cenários anteriores, tivemos uma inversão no resultado do Ibovespa. Desta vez, o investidor que veio aportando no índice, montantes menores e recorrentes, superou o aporte único.

Aparentemente, quando olhamos o Ibovespa no intervalo de 10 anos, é possível identificar que, praticamente metade do período, a Bolsa se manteve em queda — sem considerar a grande perda de valor em 2020.

Ibov 10 anos – 2010-2021

Vamos comparar com o gráfico de 1995 até 2021 aonde grande parte da evolução de longo prazo se deu de maneira ascendente.

Ibov 26 anos – 1995-2021

O que pode explicar os motivos pelos quais entre 2010 e 2021 os aportes recorrentes superaram o aporte único são dois:

  • Primeiro, o aporte único perdurou de 2010 até 2016 amargando uma desvalorização de capital. Foram 6 anos de perda de valor.
  • Segundo, durante este período o investidor que veio fazendo aportes menores e recorrentes, teve tempo hábil de comprar, por um longo período de tempo, Bolsa a preços descontados.

Importante notar que esses dois supostos motivos não se confirmaram nos períodos anteriores.

2015-2021

Penúltimo período de tempo analisado, podemos entender como um médio prazo. Como já visto nos artigos anteriormente listados, curto e médio prazo são a boa e velha loteria do mercado financeiro. Contudo, não podemos ignorar esse cenário em nossas análises.

Os resultados:

CenárioAportes acumulados (corrigidos pelo IPCA)Capital final no período
Ibovespa (1 único aporte)R$ 14.781,99R$ 22.044,03
Ibovespa (aportes recorrentes)R$ 14.781,99R$ 14.523,30
Carteira (1 único aporte)R$ 14.781,99R$ 23.596,98
Carteira (aportes recorrentes)R$ 14.781,99R$ 14.866,60

Novamente temos vantagem aos aportes únicos.

2020-2021

Como últimos cenários, vejamos o que teria ocorrido com investidores que deram início em seus investimentos pouco antes da crise decorrida do Covid.

Os resultados:

CenárioAportes acumulados (corrigidos pelo IPCA)Capital final no período
Ibovespa (1 único aporte)R$ 11.395,99R$ 9.018,92
Ibovespa (aportes recorrentes)R$ 11.395,99R$ 9.799,00
Carteira (1 único aporte)R$ 11.395,99R$ 10.372,15
Carteira (aportes recorrentes)R$ 11.395,99R$ 10.040,89

Assim como vimos em 2010-2021, o investidor que aportou recorrentemente no Ibovespa, teve vantagem — pequena — sobre o aporte único.

O que podemos concluir

Ao que tudo indica, a conclusão mais simplista, e digamos, prática, seria a de que, realmente, os aportes únicos geralmente tendem a superar os aportes recorrentes.

Contudo, seria sensato nós indicarmos a alguém, que recém recebeu um capital de um negócio qualquer, a investir de uma única vez no mercado financeiro? Nem sempre. E é aí que quero elaborar um pouco melhor o estudo.

Os pilares que norteiam uma decisão

Muitas vezes, principalmente por vieses — assim como o de confirmação — somos levados a condicionar uma análise baseado em um único caminho.

Contudo, precisamos entender que temos dois grandes pilares que devem nortear uma decisão de investimento: (1) matemático; (2) psicológico.

Olhando exclusivamente para o pilar matemático, é mais simples de afirmarmos que, na maioria das vezes — mas não na totalidade —, aportar uma única vez terá um melhor resultado.

Contudo, essa conclusão se baseia em um resultado menor à 100% de assertividade. Como vimos, o cenário de 2010-2021 se inverteu no Ibovespa.

Neste mesmo período, na melhor das hipóteses, podemos concluir que o investidor teve “estômago” para segurar seu investimento por durante 6 anos vendo-o se desvalorizar? Não podemos.

Posso até suspeitar que, salvo se esse investidor estivesse em uma “bolha”, isolado de tudo e de todos, ele certamente resgataria seu capital no pior momento, naquele ao qual sairia do mercado financeiro perdendo capital.

Posso também arriscar dizer que, o pilar psicológico sequer deixaria com que, aquele investidor de 1995-2021 que investiu um único aporte na Carteira, segurasse todo seu investimento por todo o período. Possivelmente no decorrer do tempo, acreditando que sua carteira pudesse estar sobrevalorizada e que estaria correndo risco de uma correção de curto e médio prazo, resgataria parte do capital.

Sem dúvida alguma, o maior inimigo do investidor, é ele próprio. E, certamente realizar aporte único, evidenciará fortemente esse seu inimigo. Questionamentos frequentemente surgirão ao qual não permitirá que o resultado real espelhe o resultado teórico.

Nem sempre a conclusão é matemática

É neste sentido que, geralmente, optar pela melhor estratégia psicológica seja melhor que a suposta melhor estratégia matemática.

E veja, em nenhum dos cenários — salvo 2020-2021 devido ao curtíssimo prazo — o investidor que preferiu aporte recorrentes “perdeu” dinheiro. Supostamente possa ter tido uma rentabilidade um pouco menor ao investidor de aporte único, mas perder, isso não ocorreu.

E ouso a dizer, que em raros os momentos ele pode ter pensado: será que meu capital pode perder valor amanhã? Será que mantenho, ou resgato? Do outro lado, para o investidor de aporte único, caso seu aporte fosse realmente volumoso, suponho que estes seriam questionamentos mais do que recorrentes.

Portanto, apesar da matemática e estatística nos mostrarem que, na grande maioria das vezes o aporte único pode ser melhor financeiramente em períodos cada vez mais longos, nem sempre deverá ser a única coisa a ser analisada. E se o aporte for realizado hoje, e amanhã o mercado cair 50%?

Tenho capital relevante e não quero aportar uma única vez, o que fazer

Se você está no cenário de possuir um capital relevante e sabe que seu psicológico pode ser um amigo traiçoeiro, e com isso prefere fazer aportes pontuais, uma estratégia é manter o capital em ativos mais conservadores, seguros e com altíssima liquidez.

Um exemplo seria o Tesouro Selic, considerado o investimento mais seguro no Brasil. Com este montante bem guardado, pode-se fraciona-lo em parcelas, resgatando-o aos poucos direcionando o valor para investimentos mais sofisticados.

Sugiro: Tudo sobre o Tesouro Selic.

Considerações finais

Após este estudo, espero que eu tenha conseguido ajudar você a discernir entre a matemática e o psicológico, e que, não podemos afirmar que aportar unicamente seja sempre o melhor cenário, mas que, o psicológico sim, esse será sempre nosso maior inimigo.

Portanto, a depender de quão preparado você esteja, preferir não provocar o seu eu interno possa ser uma opção melhor do que apostar todas as fichas piamente em estatísticas passadas.

Não obstante, sugiro fortemente a leitura do artigo mencionado anteriormente: “A verdade nua e crua: você poderia ter ganho mais dinheiro investindo em CDI ao invés do Ibovespa. Sem dúvidas que agregará muito valor.

Bom, espero ter agregado conhecimento e que eu tenha conseguido mostrar fatos e dados para quem você possa bem escolher qual a melhor estratégia a ser tomada.

Como sempre lhe desejo todo sucesso e prosperidade que sei que você merece.

Sucesso e prosperidade.

Boni

Escritor, autor do livro Montando uma Carteira de Investimentos Inteligente. Paulo Boniatti é pós-graduado em Gestão em Mercado Financeiro pela FAE Business School. Especialista em investimentos e adepto da filosofia do antifrágil, tem como principal característica a maneira simples e descomplicada de explicar o mercado financeiro. Além de youtuber e criador do canal SaldoZero, é também gestor do Clube de Investimentos Opportuna CI.

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